Coletivo Matrero lança EP Trecho – ouça e confira faixa a faixa

A Matrero, misto de coletivo e não-selo, começou a chamar atenção em 2012 com o álbum do Síntese, então duo de São José dos Campos (cidade onde o selo também é sediado). O duplo Sem Cortesia foi considerado pela Soma o terceiro melhor disco do ano, e frequentou outras listas importantes especializadas em rap. Para começar 2013 a turma lançou um EP/ coletânea, com tracks de artistas associados ao coletivo, incluindo Moita, Marginal, Distúrbio Verbal e, claro, Síntese.

Com o mesmo senso de baixa fidelidade e urgência que marcou o trabalho do Síntese, a coleta Trecho marca um possível “som do Vale do Paraíba” – bases secas, rimas rápidas e cheias de sotaque local, samples curtos de MPB, reggae e Tom Waits, referências sociais e religiosas, ligadas por um senso único de espiritualidade.

Baixe aqui o EP Trecho, da Matrero Records

Para mapear um pouco dessa nova cena, entramos em contato com a Matrero e preparamos com eles um faixa-a-faixa do disco, leia abaixo.

Quem é a Matrero? Como ela começou? Há quanto tempo está na atividade? Quem são os artistas representados por ela?

Na verdade, a Matrero é um projeto de vida nosso. Tudo começou em 2007, no quarto do Moita, que sempre reuniu muitos amigos, e alguns tinham em comum a fita do rap, que hoje une mais a gente. Mas a Matrero em si é uma cúpula (subversiva) da gente que pensa parecido e convive com o mesmo tratamento com a vida em relação à existência. O intuito principal é viver a vida juntos, estar juntos, independente de qualquer coisa. Não tem nada a ver com rap, é o que menos fazemos. Não é uma gravadora, não é um selo. A Matrero é muito mais do que a música, do que o rap, do que os grupos. Vários irmãos da nossa família não estão ligados a esse meio de atuação musical. É um projeto de vida.

Além do EP, a Matrero pretende lançar algum trabalho de outro artista em breve?

Tem muita coisa pronta, muita coisa sendo feita, muita coisa perdida e muita coisa guardada. Não nos preocupamos muito em lançar devidamente (artisticamente) as músicas, preocupamos mais em fazer, na maioria das vezes. O nosso tratamento com a música é totalmente baseado nas nossas vidas pessoais.

Mas o próximo movimento que estamos pensando a título de massificação é soltar uma mixtape do Moita e nosso irmão GiRap também está trabalhando em um novo álbum.

Trecho faixa a faixa

01 – Moita – “Controle da Realidade”

O Moita (22 anos) é o maior idealizador da Matrero, ensinou e ensina muito à gente. Essa faixa abriu o EP pelo teor informativo, que disserta a realidade que todos nós estamos submetidos, uma laje de pensamento que devemos frequentar. Abordando a questão da intervenção imposta no nosso livre arbítrio contra uma ordem natural, por estarmos submetidos ao espaço e ao tempo, e gastarmos o tempo para percorrer os espaços. Essa música é de 2011, produção de Neto (do Síntese).

02 – Mentes Construtivas – “Abre o Olho”

O Mentes Construtivas hoje é composto por Rbo (27), Nego Max (23) e Star Choc (20) e existe desde 2009. Essa música foi composta por Nego Max em 2010 numa fase de despertar de algumas consciências e as primeiras super associações sobre a mesma realidade a que estamos submetidos. Essa letra se encaixou muito no contexto do EP, mas só foi inclusa após termos encontrado no arquivo do Moita (que fez a base) um instrumental que proporcionava a atmosfera que procurávamos pra música. Atualmente o Max está morando em São José, na goma do Moitão, e devido ao momento em que a música foi concebida, essa foi a única faixa que foi registrada lá mesmo.

03 – Surpresa – “Débito ao Espaço”

Essa é uma música do ano passado do Surpresa (19), um irmão nosso da zona norte (de São José dos Campos) que começou a se dedicar ao rap em 2010 por incentivo do Willian. E essa é a primeira música que ele registrou. Nessa oratória ele questiona o comportamento do ser humano frente à lei de causa e efeito que se estabeleceu pós corrompimento, expondo a parcela de responsabilidade de cada ser no mesmo lote de tempo e espaço pela atual condição de existência.

04 – Marginal – “Parque Interlagos”

O Marginal (21) é um dos irmãos que começaram a ideia da Matrero com o Moita em 2007. Ele sempre escreveu desde antes de fazer rap. Ficou muito tempo sem registrar nada, serviu o exército, passou muitas tribulações e no ano passado voltou a poder dar uma atenção pro rap.

Esse som tem uma estética rústica em sua...

construção, influenciado muito por grupos de gerações passadas do rap nacional – a base foi produzida pelo próprio Marginal. Nessa ideia ele expõe uma condição de existência comum em muitos lugares, num tom de revolta e indignação de quem sofre esses efeitos. E é a música que faz o gancho no contexto do EP, de um ponto de vista paralelo de quem tem o universo na cabeça e os pés no chão. Descendo a noção.

05 – Distúrbio Verbal – “No Sertão”

O Distúrbio Verbal existe desde meados de 2000, na zona leste, hoje em dia é formado por LDR (pioneiro do grupo – 30), Matheus (22) e Inglês (21). Nos aproximamos depois, em 2010, e tivemos uma identificação pessoal muito grande. Essa música é a mais ilustrativa do EP. É um retrato, um relato pessoal de um retirante, o sentimento ao se retirar, e ao estar longe do seu chão. A letra foi inspirada pelo instrumental do Willian, com um sample de música nordestina.

06 – Distúrbio Verbal – “Nostalgia da Alma”

Nessa música o Matheus fala do fundamento de habitar a eterna estadia cósmica do nosso espírito, não trair nossa essência nessa era corrompida e delata um pouco do oculto sobre reino do mal. Foi direto ao ressaltar as diferentes formas desse mal e como combatê-las. Jesus é o caminho, a verdade e a vida.

07 – Fuzil – “Aspecto” [Part. Síntese]

O Fuzil (25), assim como o LDR, é uma das maiores influências e admirações que temos na Matrero. O Fuzil faz rap há muitos anos, é ex-integrante do Rot Crew, que influenciou muita gente aqui em São José. Ficou afastado do rap muito tempo, e ano passado viemos a nos aproximar e começamos a incentivá-lo a voltar a registrar. Esse som, com base do Neto, traz um pouco do que considerar pra assumir uma postura frente à opressão e como tratar linhas perdidas de pensamento. E faz associações de como isso compromete práticas gerando realidades de densas atmosferas, cada vez mais comuns.

08 – Subversão – “Nunca Me Deixe Ir” [Part. Disturbio Verbal, Willian Monteiro e Surpresa]


O Subversão é um grupo de 2011, formado por Moita, Leonardo (20) e Neto (19). Foi um projeto de vida, daquela fase que os três passavam, que uma vez praticando uma tese em conjunto, culminava numa postura subversiva radical frente à vida imposta e seus personagens. Nessa fase eles produziram e registraram um álbum, até. A ideia desse projeto possui uma peculiaridade, todas as músicas são feitas a partir da mesma ideia e com o mesmo nome das originais que sampleamos nos instrumentais, faz também uma associação com a fita de pessoas em lugares diferentes do mundo, há anos atrás, muitas vezes, terem os estalos do despertar das consciências.

E depois disso surgiu a ideia, num momento em que estávamos em comunhão na casa do Willian (Unidade II da Matrero), de fazer uma música todo mundo ali na hora. Todos escreveram e gravaram ali mesmo também, foi uma celebração, até o Willião rimou. O tema principal foi que todos são um só em um só todo, onipresente, e morando nesse sentimento, se doar, levar a luz e o amor adiante a quem secou, na crença de que sejam luz e amor também. O instrumental do Moita foi feito no mesmo momento que foi concebida a letra, a partir de um sample de Monique, “Never Let Me Go”.

09 – Síntese – “Máscara da Rua” [Remix]

O Síntese é formado por Leonardo e Neto. Em 2010 fizemos algumas cópias da primeira demo tape deles, e em 2011 a mesma coisa com a promo tape. Depois, ano passado, soltamos também os registros de um álbum duplo da dupla na rede.

Essa faixa é uma outra versão, que temos há muito tempo, de uma música que constitui o Sem Cortesia. Foi, inclusive, a primeira música que os dois fizeram juntos na vida, em 2008. Ela é uma reflexão emocional, seguida por um relato incisivo sobre a realidade do portão pra fora e tudo que a perfila.
Fonte:SOMA



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